sábado, 23 de outubro de 2010

O MERCADO DE ARTE – O SURGIMENTO DOS LEILÕES =


Na década de 1960 não havia mercado de arte.- Desde que por mercado se entenda oferta de compra e venda.- -Existia somente galerias que vendiam quadros, mas não compravam.- Tinham um acervo em consignação ou de colecionadores ou dos próprios pintores.- Ou seja, não tinha liquidez. Quando alguém queria vender um quadro, deixava em consignação na galeria e o galerista, erroneamente chamado de marchand, procurava um comprador.-
Faltava profissionalismo, faltava liquidez , faltava credibilidade no mercado de arte.
Como nada acontece por acaso, na década de 1960, mais para o final, 1968, precisavam de dinheiro para equipamentos do Hospital Albert Einstein e os judeus fizeram uma campanha de arrecadação de obras de arte para a realização de um grande leilão.- Era um fato inédito. Foram direto aos artistas, pintores, escultores, galerias, colecionadores, etc. e arrecadaram um grande lote de obras de arte.
Chamaram o Baccaro, galerista muito atuante na época e o contrataram para realizar um grande leilão beneficente para arrecadar fundos para o Hospital. Tanto pintores, galeristas, colecionadores colaboraram na doação de obras para compor o acervo a ser leiloado.
Houve uma grande afluência da colônia judaica, colecionadores e publico em geral.- Nunca tinha sido feito um leilão de obras de arte, era o primeiro feito com tanta pompa e circunstancia. Inclusive havia muita curiosidade para ver como ia funcionar.-
O leilão foi realizado e foi um sucesso total e assim foi descoberto um meio de venda maciça de obras de arte em dois ou três dias.
Considerando um mercado de arte estagnado em que viviam as galerias, essa nova modalidade veio dar sangue novo, pois em uma só noite vendia-se em torno de 150 quadros.
Para contribuir com o êxito dos leilões, a Bolsa de Valores vivia uma de suas maiores altas da historia.- Começava o momento do milagre econômico brasileiro onde tínhamos inflação mas não tinha recessão.- O dinheiro circulava. E tanto a Bolsa de Valores como o mercado de arte, era o meio propicio para se “esquentar o caixa dois”
Aproveitando essa oportunidade, Jose Paulo Domingues da Silva, ou como queiram Paolo Businco, montou a Galeria Collectio que se transformou na maior empresa de compra e venda de obras de arte, cuja maior façanha foi trazer os Bancos para financiarem a transação de obras de arte, preenchendo assim uma lacuna que havia nesse setor.- Antes da Collectio quem tinha um Portinari não conseguia vender senão deixando em consignação. Com a Collectio se alguém tivesse 10 ou 20 Portinari , “o Zé Paulo” comprava a vista. Com esta atitude a Colletio trouxe credibilidade e segurança ao mercado de arte.- A partir daí a compra e venda de obras de arte passou a ter liquidez e principalmente credibilidade.-
Jose Paulo Domingues da Silva, como era conhecido, montou um esquema de financiamento de obras de arte inédito na época.- Convenceu as grandes financeiras bancassem o financiamento como antecipando empréstimos para fundo de liquidez (compra e recompra) do mercado, tendo como garantia quadros que eram avaliados por ele mesmo ( colletio).
Para aumentar o lastro de financiamento e empréstimo , José Paulo criou mecanismo de super valorização da pintura em condições artificiais.
Como os leilões eram fiscalizados por órgãos oficiais (Associação Comercial entre outras) a Colletio só vendia em leilões e o público ingênuo que não conhecia os bastidores de um leilão, acreditava nos lances “frios” e vendas fictícias que eram praticadas para valorizar rapidamente o lastro dos financiamentos.-
Um mercado precisa de mercadoria e a mercadoria no mercado de arte é a obra e o artista.- E para acrescentar ou atribuir valor tanto a obra como o artista era comum criar argumentos de toda natureza para valorizá-la.
Muito bem, a Colletio de Zé Paulo organizou um “time de pintores” exclusivos comprando e promovendo toda produção desses pintores.- Eu fazia parte dos pintores exclusivos da Colletio..
Esses leilões eram verdadeiros acontecimento social .- Na semana que antecedia o leilão havia um forte esquema de marketing e os jornais que representavam o principal meio de comunicação da época tinham duas paginas de propaganda alem de críticos de arte, coluna social, etc, estarem colaborando com a Collecio
Na época a palavra do Zé Paulo era lei.- Ninguém sabia ao certo quem era ou de onde veio.- Históricas fantásticas contavam a seu respeito mas ninguém duvidava de nada.- Ele tinha realmente o dinheiro e mandava no mercado.
Isto durou de 1969 até 1973 , até que a bola de neve virou água.
A historia do Zé Paulo ou Paolo Buzinco e da Colletio não interessa para nosso roteiro, mas quem quiser saber consulte os jornais da época.- Hoje pela internet é fácil.

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OS BASTIDORES DO MERCADO
(complemento de certos comentários do capitulo anterior )

Por volta de 1968 teve inicio uma atividade intensa no mercado de arte e já a esta altura com a Galeria Colletio de Jose Paulo Domingues da Silva,pseudônimo de Paolo Businco, tomando a liderança .- Portanto leilões de arte era uma atividade nova, desconhecida por todos, fácil de manipular com manobras desconhecidas pelo público.-
Como faltava “mercadoria”, que no caso eram obras de arte, a Colletio tinha que valorizar os velhos pintores e descobrir os novos para ter lastro do aval e ainda ficar com a custodia dos mesmos junto as financeiras criando assim uma situação artificial de cotações e lances “frios”.- Era fácil elevar as cotações e manipular o mercado de acordo com suas necessidades.
Assim sem saber , estava matando dois coelhos com uma paulada só, Zé Paulo hiper-valorizou a cotação de todos os seus pintores , paralelo a isso, os quadros acabavam sendo vendidos satisfazendo o status dos novos ricos , tendo como pano de fundo a alta da Bolsa de Valores.-
Uma pratica que passou a ser freqüente nos leilões e o publico ignorava era (ou ainda é ) criar uma cotação fictícia para um pintor.- Por exemplo, quando era apresentado o quadro, o leiloeiro fazia um breve comentário sobre o autor e obra e em seguida começava a pegar os lances : -“ 100, 150, 200,200, 200, 250, vamos La gente, estão pagando a moldura, 300, 350, 350, 350, vou vender... vou vender... 400, 500,500, vou vender, 600 la no fundo, ninguém mais, vou vender... 650, 700, 800 aqui, parabéns, 850 obrigado, 850, 900 la no fundo, 1000, 1000, vou vender, dou-lhe uma, dou-lhe duas, 1.100, ninguém dá mais, dou-lhe uma, dou-lhe duas, vendido.-“
Tudo isto não existiu.- Foi fictício.- O quadro vale na realidade 200 reais e coloca-se dois quadros no leilão.- O primeiro é feito essa encenação e o segundo sai por 600 a 800 reais onde o comprador acha que fez um grande negocio e a galeria fatura de 200 até 500 por cento conforme o caso. ( os números são hipotéticos apenas para ilustrar o fato).
Esse artifício foi usado abusivamente no inicio.- Até eu que estava nos bastidores disso tudo era enganado. Eu nunca sabia se meu quadro tinha sido vendido ou não.- Muitas vezes o quadro não tinha comprador e para não parecer encalhe e prejudicar o pintor , o leiloeiro fazia uma venda fria , e já que o lote estava perdido, super valorizava.
O mercado de arte estava tão bem conceituado , onde circulava valores altíssimos, tanto mais porque era considerado como investimento onde toda mídia dispensava um bom espaço para a matéria.-Os jornais dedicavam cadernos inteiros só para artes plásticas onde invariavelmente era publicada a cotação dos quadros. A TV também reservava um espaço em seus noticiários dedicado as ates plásticas e suas cotações.
Voltando a Colletio, desenvolvia um trabalho serio pagando corretamente pintores, vendedores, leiloeiros.- Nada de mercadoria falsa ou negocio ilícito. Com esta atitude dava credibilidade ao mercado e ficava mais fácil “pegar” dinheiro nas financeiras , dando como garantia obras hiper valorizadas e a própria Colletio ficava com a custodia das obras que as dava novamente em garantia para outra financeira, assim ia... Era a raposa tomando conta do galinheiro.
Esse esquema exigia seriedade, não brincar em serviço,já que o dinheiro vinha fácil, das financeiras e do publico.
Com o fechamento da Colletio por motivos que não nos compete comentar agora, vieram os oportunistas de plantão.- Virou baderna. O mercado ficou acéfalo.- Sem liderança. Uma avalanche de péssima arte eram oferecidas ao publico em 3 ou 4 leilões por dia , alem da infinidade de quadros falsos que começavam a aparecer.-
Tudo isto graças a hiper-valorização provocada pela Colletio que como os preços foram inflacionados em apenas dois anos, qualquer coisa que fosse vendida por 20 ou 30% dos preços inflacionados, já estava bom demais e até acima do preço real.- E foi assim que os preços dos quadros despencaram, em que pese , outros fatores contribuíram para a quase falência do mercado de arte.
Nesse período havia inflação na economia brasileira mas não havia recessão, portanto o dinheiro circulava.- Com o governo Collor que confiscou o dinheiro do povo , iniciou um período terrível de recessão com inflação e desemprego .-Em uma época de crise o mercado de arte é o primeiro a sofrer as conseqüências e o ultimo a se recuperar- O que estamos esperando até hoje (2.010).-

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