sábado, 23 de outubro de 2010

BALANÇO DE VIDA =
Olho para trás e vejo o caminho que percorri, o quanto trabalhei e me dediquei à arte. Até hoje, aos 70 anos e espero me dedicar muito mais, e embora o talento, se é que tenho, com todo esse tempo de pratica, ainda trabalho com muita dificuldade para resolver as questões de arte.
Já superei muitas fases da pintura. Sim, são muitas as fases que o artista têm que superar durante sua vida. A fase da curiosidade, a fase da auto-afirmação, a fase do domínio técnico, a fase da aprovação de seu público (parentes e amigos), a fase da vaidade e busca de aplauso, a fase de alcançar o profissionalismo, a fase das pesquisas, a fase de entrar no mercado de arte, e algumas outras fases que não me ocorrem no momento.
Quando passa tudo isso na vida de um artista, dependendo do que sobrar nessa decantação, será a qualidade que o artista terá.
Às vezes, depois de tudo isso, somando-se a fase do aprendizado, que tínhamos esquecido, não sobra nada além de uma arte medíocre.
O porquê disto? Porque existem dois tipos de reconhecimento da realização artística. Um deles, o que é mais cobrado, é o reconhecimento do público e da crítica e a afirmação no mundo da arte.
Pintar é fácil, difícil é convencer os outros que nossa pintura é boa.(esta frase é do Massimo Picchi )
O outro, é o reconhecimento próprio. Aquele que é o próprio autor e “consumidor” de sua arte. Aquele que produz arte, pesquisa, estuda, aprofunda-se, evolui, sem se preocupar em mostrar, vender ou procurar a opinião de quem quer que seja. Esse é o mais feliz, mais autêntico e o que chega a melhores resultados, porque é autêntico e espontâneo. Aqueles que vão em busca da primeira alternativa não estão preocupados com sua autenticidade e sua realização pessoal e sim com que os outros acham. Quando atingem a aprovação da crítica e do público, principalmente com sucesso financeiro, estacionam nesse patamar para que brilhe a vaidade pessoal e para não matar a galinha dos ovos de ouro.
Pois bem, depois que o artista passa por todas essas fases, aí sim ele começa a maturidade e está pronto para começar a fazer arte, ou seja, para começar a aprender a fazer arte. Isto não quer dizer que o iniciante ou durante o aprendizado, seja qual for o tempo de duração, não esteja fazendo arte. Já no início do aprendizado o aluno já está produzindo arte, uma arte correta do ponto de vista técnico, com criatividade, etc. Porém, longe de ter extraído toda a sua potencialidade, porque arte é expressão de vida e enquanto tiver vida, as expressões vão se renovando, evoluindo e se distanciando cada vez mais das expressões passadas.
Parece meio complicado, mas é aí que eu chego à conclusão de que arte é filosofia e enquanto se vive não se termina a fase de aprendizado , criação, de uma nova modalidade de expressão com total e irrestrita liberdade que só a arte permite.-.
O artista é um vaidoso por excelência. Esta ”virtude” acompanha o talento.
Todo artista precisa de público, assim como o escritor, ator, cantor, poeta, etc.
Toda forma de arte é uma forma de comunicação e expressão e a comunicação só se completa se ela for recebida.
O pintor não foge à regra. O produto da pintura é o elemento da comunicação entre o artista e o mundo, e quando essa comunicação se completa, existe o objetivo atingido com um misto de orgulho, satisfação, vaidade. Porém, muitas vezes o artista não cria para mostrar ou agradar ninguém. Cria apenas pela necessidade de se expressar pela sua linguagem (pintura).
A pintura é o tipo de expressão que não usa palavras, por isso ela é universal.
Picasso, quando pintou “Mulheres D’Avignon” não colocou uma tela no cavalete e disse: “hoje vou inventar o Cubismo!” Picasso começou a trabalhar uma idéia, sem saber o que fazia. Começou a buscar uma nova forma de expressão. Muito depois é que o resultado foi avaliado.
Mas o importante é ressaltar que no ato da criação, o artista fica num verdadeiro transe, movido por forças acima de sua vontade. E o artista nunca freia ou inibe esses impulsos. Deixa que tudo vá fluindo e explodindo como um vulcão em erupção. No final faz-se a avaliação do resultado. Quase sempre valeu a pena, às vezes não. Mas não se deve reprimir os impulsos, que no final fica ao menos a espontaneidade da expressão.
Fiz este comentário para avaliar minha postura diante da arte. Quando relembro o que fiz, sinto que tive uma manifestação honesta, espontânea, fruto de uma força interior muito forte, cujo resultado não poderia ser desprezível.
Sempre disse que faço arte por amor e por dinheiro. Portanto, o ato da criação nasce sempre lá do fundo do próprio ego tendo sempre algum tipo de impulso criativo. Às vezes espontâneo outras vezes provocado. Mas sempre é fruto da sensibilidade do artista. E essa sensibilidade, quando existe, nunca é traída. Quando olho meu acervo de quadros, sinto uma verdade expressa. Vejo que existem símbolos, signos, mensagens impregnadas de expressões por vezes densas até demais. E essa verdade eu tenho certeza que permanecerá. Talvez eu continue sempre no anonimato, mas meus trabalhos continuarão vivendo o meu “eu superior”.
Quem sabe algum cidadão, também anônimo, em algum futuro, vai se identificar com algum de meus trabalhos. E esse cidadão anônimo estará mandando uma vibração positiva para onde eu estiver.
Se algum dia esse futuro chegar, é então porque eu cheguei lá!

3 comentários:

  1. Oi Speltri,

    Este comentário tem mais link com seu penúltimo post...
    Comprei um livro esses dias que foi lançado recentemente, chama-se "A Grande Feira - Uma Reação ao Vale-tudo na Arte", de Luciano Trigo.
    Lembrei de vc. Aí vai a sinopse:


    Uma das questões centrais de 'A grande feira', ensaio sobre arte contemporânea, é a subordinação da figura do artista ao sistema de arte. Somos provocados a nos questionar se a chamada arte conceitual (instalações, performances etc), seria, de fato, arte. Este talvez seja o ângulo mais agudo a ser investigado neste livro. Em vez de uma reflexão filosófica ou estética, este ensaio traça as relações éticas, a atuação do artista contemporâneo no mundo real. Luciano discute também o papel de todos os atores envolvidos nesse sistema - artista, crítico, curador, marchand, casa de leilões, cadernos de cultura, universidades, museus, revistas especializadas, colecionadores.

    Um abraço!
    Midori

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  2. Que saudade de seu brilhantismo!!
    Quem tem luz própria, personalidade forte e um grande carisma dá nisto se torna inesquecível!! Sua arte reflete você como já explicado acima...portanto ela será também inesquecível!
    Um grande abraço.
    Lucilene Faria ex-aluna panamericana

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