terça-feira, 16 de março de 2010

BIENAL

BIENAL



Vale a pena fazer algum comentário sobre as Bienais, principalmente para os iniciantes em arte é importante saber como surgiram, qual sua importância, o que representam desde seu surgimento até os dias de hoje.
No final do Século XIX, ainda sob o reflexo da Revolução Industrial o mundo passou por um momento de ebulição com novas invenções de maquinas e equipamentos para todos os setores tais como industria têxtil, agropecuária, alimentos industrializados, enfim em todo ramo da atividade humana .
Em vista disso surgiu a necessidade de um intercambio industrial, comercial e cultural entre os povos para que fossem divulgados, e comercializados toda a nova tecnologia bem como o novo pensamento que surgia no mundo.
Os meios de comunicação e informação eram lentos. Para suprir essa deficiência e estabelecer a troca de informações e se tomar conhecimento das últimas descobertas e invenções, foram criadas as Feiras Internacionais para cada setor de grande importância para a sociedade. Logicamente como eram eventos que atraia pessoas do mundo todo, aproveitava-se a ocasião para lançamentos de livros, concertos, teatro etc.
Países ou mesmo cidades ficavam com o calendário tradicional de determinadas Feiras e assim anualmente tomava-se conhecimento das últimas novidades daquele setor especifico. Estabelecia-se troca de informações e desenvolvia-se o comercio.-

(Aqui em SP, as Industrias Reunidas F.Matarazzo tinham diversos produtos premiados na Feira Internacional de Alimentos de Milão,- inclusive o óleo comestível “Sol Levante” )

Aqui cabe um comentário a margem do assunto que por ser pitoresco e já conhecido por muitos, vale seu registro.-
A Torre Eiffel foi construída em Paris em 1889 para inauguração de uma feira internacional e seria demolida em seguida.-
Gustav Eiffel, engenheiro especializado em pontes e estruturas de ferro, que participou também da construção do Canal de Suez e da estrutura da Estatua da Liberdade, queria divulgar sua tecnologia.
Porem muitos os parisienses consideravam um monstrengo de extremo mau gosto, inútil, e que interferia na silueta da cidade, porem, apesar dos protestos permaneceu e com o tempo passou a ser o símbolo de Paris.
No começo do Século houve uma forte pressão para derrubá-la.- Em 1909 quase conseguiram, porem só foi mantida em pé por causa da antena que fica em seu topo de 300 metros de altura, que na época já era muito útil.-

Era preciso também no campo das artes um intercambio cultural para se saber o que havia de novos conceitos em todos os cantos do mundo, principalmente
em uma transição do Século XIX para o Século XX onde havia uma efervescência mental de novas idéias e invenções.
Para suprir essa falha foi organizada a Bienal de Veneza em 1895 que passou a servir de parâmetro sobre os rumos que arte estava tomando.
No Brasil, no inicio do dos anos 50, o mundo ainda estava juntando os destroços de II Guerra Mundial, sob o patrocínio de Francisco Matarazzo, organizou-se a Fundação Bienal Brasileira, assim passou a existir duas Bienais : a de Veneza e a do Brasil.-
Não seria necessário descrever aqui todos os movimentos, estilos e conceitos de arte que passavam pelas Bienais.- É dar vazão a imaginação e ver um Laboratório de experimentos artísticos onde alguns de fato virariam arte. Ou como diria o grande oportunista Marcel Duchamp, ‘TUDO É ARTE”.- Assim, tudo que era apresentado nas Bienais, que passava por um crivo da comissão de cada pais, teria a chancela de “ARTE”.-
Assim a cada dois anos (em arte não precisa mais do que esse tempo) as Bienais cumpriam seu papel de mostrar a arte de ponta que se fazia no mundo.- Era a fonte de informação onde todos os países interagiam.-
Acontece que o mundo é dinâmico e fatos alteraram o curso até então normal e estabilizado quando por volta de 1970 começaram a surgir os primeiros computadores mais potentes agilizando violentamente as informações , dando uma nova dimensão aos recursos até então insipientes e acanhados.-.- Porem, podemos considerar desde que não existe uma data precisa , de que a partir de 1980 a informática já facilitava e simplificava todos os setores da Humanidade.-
A partir desse avanço tecnológico sabia-se tudo o que estava acontecendo no mundo a cada momento.- Esportes, acidentes, concertos, noticiários, guerras ( devemos lembrar que a guerra do Golfo e a guerra das Malvinas foram transmitidas ao vivo pela TV lance a lance como se fossem partidas de futebol. Enfim estava começando a globalização.- O mundo , via internet, estava em nossa sala.-
Com isso, inaugurou-se uma nova era com a informação agilizada em todos os cantos do mundo, as Feiras Internacionais bem como as Bienais perderam o objetivo.-
Como as Bienais são fundações, elas continuaram a existir não mais com a bandeira da vanguarda mas sim como uma salada mista de parafernália que só confunde a cabeça do público e mesmo assim repetitiva ano a ano.
A prova de que a Bienal perdeu seu foco é verificar que já a partir da década de 1980 o que conseguia atrair público e tornar o evento viável eram as retrospectivas de escolas centenárias tipo : Sala Especial dos Impressionistas, Sala Especial dos Expressionistas, Sala Especial dos Cubistas e assim por diante.-Ou uma retrospectiva de um único gênio da pintura.-
Assim a cada dois anos iam buscar em algum parque jurássico da arte algum dinossauro para atrair o publico
A arte do passado que marcou o rumo até onde estamos hoje os museus de todo mundo estão repleto delas.- Livros, Museus e agora Internet se encarrega de levar até a casa do interessado todo esse material.
A função da Bienal seria ou deveria ser outra, o de mostrar o que ainda não existe ou que está em gestação para vir a ser um dia. Mas parece que não há mais nada.-
A arte está acéfala.
A arte como manifestação visual na qual elementos encerram um conceito e comunicam uma mensagem e um conteúdo parece que acabou.
Hoje a classe dominante representada por críticos e curadores elegeram a ausência do objeto arte restando apenas a “intenção de arte”.-
O artista hoje não precisa mais ter talento,habilidade, conhecimento dos conceitos , precisa apenas ser um grande cara de pau, bolar um folheto explicativo como um manual de aparelho domestico, contratar uma galeria e o espaço vazio da galeria já é a obra onde o espectador interage com esse espaço podendo até sentir-se insignificante diante do infinito das possibilidades do ser ou não ser na razão direta das massas e na razão inversa do quadrado das distancias cósmicas, mundanas ou vegetativas (!!?? Até eu estou ficando vigarista).
Quando vemos, e isto existe, a arte chegar a este ponto só me resta jogar os pinceis e as tintas no lixo , pegar meu boné, apagar a luz e dizer - : Fui .-
O único culpado de tudo isto foi Marcel Duchanp que aproveitando a oportunidade da efervescência de idéias novas que surgiram no começo do século XX, como por exemplo fauvismo em l904, cubismo em 1907, abstracionismo em 1910, entre outros movimentos (surrealismo, expressionismo, concretismo, etc.) , na qualidade de artista tentou todos esses movimentos até se fixar no movimento futurista italiano que a grosso modo pretendia colocar movimento dentro do conceito cubista, onde é conhecido seu quadro “ Descendo a Escada”.- Ou seja, Duchamp bebeu na fonte de água potável, mas foi mais fácil para ele aproveitando a oportunidade da aparente confusão do momento e criar atitudes chocantes, insólitas, esdrúxulas tais como pegar um vidrinho e dar o título “ Ar de Paris”.- considerá-lo como um oportunista, ele que era um conhecido gozador de suas próprias idéias é o mínimo que podemos fazer.- Dividir o lado genial , de idéias avançadas e avançadas até demais, do lado pilantra debochado.- Acontece que todos , ou grande parte do público o levou a serio porque criatividade é fazer alguma coisa que não existe e se não existe não existe parâmetro de aferição, assim naquele caldeirão em ebulição da época , acreditaram nesse Duchamp, que em um verdadeiro canto do cisne integrou o grupo dos dadaístas que era um movimento perfeitamente nos moldes das idéias de Duchamp.- Era um movimento de arte contra a arte, por mais paradoxal que possa ser.- Era contra a idolatria dos ícones dos museus, era contra os museus, era contra o mercado, era contra a arte como decoração para enfeitar paredes, e assim por diante.
Acontece que ele agia como dizendo :” faça o que eu mando mas não faça o que eu faço”.- Isto porque se era contra o mercado de arte ele vendeu mais de 45 uri nós de banheiro masculino, intitulados “Fonte” para museus e colecionadores.-
Como uma atitude de impacto contra os museus e seus ícones, como grande intuição de marketing que tinha, pegou uma reprodução de Mona Lisa de Da Vinci e colocou bigodes.- Essa atitude foi um ultraje ao pudor das artes porem ele consegui o que queria, chocar o publico e ganhar notoriedade
Enquanto isso vendia a peso de ouro as baboseiras que produzia a colecionadores cativos.-
Depois dele muitos queriam seguir seu caminho que era muito fácil, não precisava ter talento, criatividade nem ser artista para fazer o que ele fazia, mas grande parte do público, artistas e critica não entenderam o recado do dadaísmo.
Uma das partes positivas do dadaísmo é quando procura demonstrar que arte não estava somente em um quadro ou em uma escultura.- Nossos sapatos, óculos, cadeira, panelas, enfim produtos de consumo tem arte.- Porque um objeto é um utensílio ele não é arte?
Visitei o museu do Ouro em Lima – Peru e passei horas vendo verdadeiras obras de arte, porem não foram feitas para serem obras de arte.- Eram todos utensílios , facas, ferramentas, vestimentas etc.-
H.Gombrich afirma sabiamente em seu livro que não existe arte, existem os artistas.- É o tipo da afirmação que parece estranha mas quando se pensa no assunto percebe-se a coerência.-
Daqui a 500 ou 1000 anos nossos utensílios tais como sapatos, relógios automóveis, computadores, etc. estarão em algum museu sendo vistos como objetos de arte.-
Quando Marcel Duchanp expôs uma privada, uma roda de bicicleta e pôr bigode na Mona Lisa, o recado de Le era muito serio.- Ele estava contestando e afirmando uma grande abertura dentro da conceituação artística.- Pelo menos ele pos todo mundo para pensar.-
Porem o pior da historia é que muitos embarcaram nessa canoa do dadaísmo sem saber remar.
Como é que muitos querem resolver problemas de física quântica se não sabem somar dois mais dois? Foi isso que aconteceu.
Artistas começaram a produzir em cima desses conceitos evoluídos sem entenderem seu significado.- E o mundo da arte se viu poluído por uma avalanche de drogas.- Um verdadeiro festival de besteiras e de charlatões que conseguem espaço na mídia e Bienais e passam a confundir a cabeça dos incautos-=
Risos e indignação é o resultado.-

Estamos fazendo estes comentários para entender o porque da nulidade das Bienais e eventos de arte contemporânea que acontecem no atual momento.- Acredito termos o direito pelo menos de pensar, avaliar já que estamos sob protestos dentro dessa platéia.- Acredito termos o direito de saber da arte de onde veio, onde está e para onde vai.
Estamos neste inicio deste terceiro milênio onde os talentos qe surgem não tem onde expor e assim ninguém os vê e não são descobertos.- Portanto os talentos já nascem mortos por um esquema viciado e as autoridades governamentais não estão preocupadas com arte porque arte não dá voto ou caixa dois.
Desde 1980 quando foi mudada a regra da constituição da representação brasileira, quando até então havia uma inscrição democrática onde todo e qualquer cidadão brasileiro poderia se inscrever para ser submetido a um corpo de jurados para procederem a seleção.-Pois bem, desde então entra ano e sai ano e são sempre os mesmos representantes.- .- Assim, desde então fica atribuída a própria Fundação Bienal a escolha e seleção dos artistas participantes .-
Já abordamos esse assunto em outra crônica e não se faz preciso repetir-lo aqui, mas convenhamos, é um esquema viciado, passível de duvidas e de truculência .
E a classe artística é tão fraca e desunida que todos sofrem as conseqüências com tamanha passividade quando poderiam usar seu próprio instrumento de comunicação para protestar que é sua própria arte.
Os que estão engajados no sistema não tem por que protestar e o resto, bem o resto é resto...
Aqui vale a pena citar H.Gombrich em seu livro Historia da Arte - : - “ ... seja como for, a atração da anti-arte foi irresistível para muitos jovens e estudantes de arte, e na década de 60 os críticos começaram a falar a respeito do “neodadaismo”.- Contudo não é o rotulo que importa, evidentemente, mas a sutileza e o talento que podem participar nessas montagens de objetos descartados” .-
Um outro fato que vale a pena seu registro é que todas as outras artes desenvolveram sua expressão acompanhando a contemporaneidade porem sem perder o foco e o objeto próprio. Por exemplo, a musica cuja espinha dorsal era o ritnmo e a melodia.Muito bem , a contemporaneidade descobriu que o caos e a desordem gera padrões, assim a musica perdeu o ritmo e a melodia mas mantendo seu objeto próprio que é o som mesmo que seja ruído.-Aí estão Benjamin Britten, Bella Bartock entre tantos outros.- Assim a musica é contemporânea e acompanha o momento atual de seu tempo.
A dança abandonou os gestos leves, suaves para desenvolver movimentos concretos, enérgicos , que são verdadeiras academias de musculação que não deixa de ser a expressão atual. Assim a dança não perdeu seu foco de expressão corporal dentro do tempo atual.- Ou alguma coisa é de seu tempo ou não é de tempo nenhum.
Se fizermos uma observação mesmo que superficial veremos que todas as artes, fotografia cuja Tonica principal era o foco nítido hoje os artistas dessa área procuram desfocar a imagem.- O cinema, poesia, literatura, teatro, enfim todas as artes atualizaram suas linguagens para a contemporaneidade sem perder o foco ou seu objeto próprio.-
Porque então que tudo em nome da nova denominação “artes Visuais” que estaria mais atualizado se fosse “artes sensoriais”, tudo que é perceptível pelos nossos órgãos sensórias tais como visão, paladar, audição tato, olfato hoje integram o rol do universo das artes plásticas, ou arte contemporânea, incluindo fotografia, cinema, expressão corporal, luz/sombra e etc.
Todas essas representações poderiam ser válidas e representativas de um novo segmento da manifestação humana, poderiam ser um laboratório de pesquisa inclusive da psiquiatria e psicologia (estudando o comportamento humano e quem sabe encontrando cura para muitos males) e não mascarar como artes plásticas iludindo o publico incauto.
Como se vê, somente as artes visuais perderam o foco que foi colocado em um deposito de lixo onde tudo é valido porque , como disseram, tudo é arte.
Quem cita problemas e não aponta soluções está fazendo anarquia e como não é meu caso, minha proposta consiste em se considerar a Bienal como um centro de estudos onde alguma coisa poderia vir a se transformar em arte depois de depurada, decantada , reavaliada em um longo processo de alguns anos.- Isto para não se cometer os erros dos críticos e historiadores que perderam o crédito desde o final do Sec. XIX quando quando tripudiaram em cima nada mais nada menos que Cézanne, Van Gogh e Gauguin, não os reconhecendo como os pilares da arte contemporânea.
A confusão de conceitos, de idéias, de propostas, a falta de conteúdo Universal, de representação de contemporaneidade, falta de unidade, falta de coerência, demonstram uma desordem, um caos no desenvolvimento da arte.
Jamais poderia se considerar que tenha acabado a fonte de expressão, competência, criatividade da arte porque ela (a arte) nada mais é do que a expressão da Humanidade e convenhamos, a Humanidade apesar de todos os contratempos não esta esse caos que existe entre criador (que não podemos chamar de artista) e criatura ( espectador).-
Talvez o mundo artístico esteja passando por uma crise de criatividade ainda considerando que a evolução desenvolvida no Sec. XX foi muito rápida e brusca, abalado com duas guerras mundiais, não deu tempo para assimilar tudo de tão grande volume de novos conceitos.-
Porque não esquecer temporariamente Duchamp e fazer uma releitura de tudo que se fez até quase final do Sec. XX..-
Porque não agir como os ruminantes, mastigar tudo novamente e devolver em forma de uma arte atual com uma nova linguagem contemporânea que haja comunicação entre obra e espectador, porque a comunicação só é completada quando ela é recebida.
Ingres speltri - escrito em 2001 – reescrito em 2010

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2 comentários:

  1. È verdade! Mas o problema está também no receptor...o que querem ver?? Hoje obras com intenções políticas estão na Bienal!! E são verdadeiras apologia ao crime!!
    E se reagimos e pedimos para tirar dizem que estamos censurando!! Não é fácil!
    Lucilene Faria - Panamericana

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  2. Muito bom Speltri! Vale repfletir muito sobre tudo isso.

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